Nota metodológica
A medida do dispêndio em pesquisa e desenvolvimento (P&D) é um dos principais indicadores dos esforços realizados para estimular a criação de conhecimento novo e a inovação. Embora conte com referências metodológicas bem estabelecidas no Manual Frascati, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE), e séries históricas relativamente longas, sua construção é complexa, sobretudo pelas dificuldades de operacionalizar o conceito de P&D.
Desde os primeiros anos da década de 2000, a Fapesp produziu esses indicadores para o Estado de São Paulo, combinando as informações da Pesquisa de Inovação, do IBGE, com outras, obtidas de fontes secundárias e de levantamentos diretos. Além das empresas, seus indicadores cobriam as instituições públicas de ensino e pesquisa, mas não contemplavam um conjunto significativo de instituições com atividades de P&D, especialmente as de caráter privado.
Para suprir essas lacunas, em 2019 a Fapesp aprimorou seus procedimentos metodológicos, desenvolvendo um novo método para calcular os dispêndios em P&D no Estado de São Paulo, mais próximo do preconizado pelo Manual Frascati. Essa revisão implicou a ampliação do universo de instituições consideradas e a realização de levantamento primário de informações, abrangendo, além dos dispêndios, as fontes de financiamento das atividades de P&D. Para tanto, foi estabelecida parceria com a Fundação Seade, de modo a dispor de instrumental de coleta padronizado, garantindo a uniformidade conceitual das informações obtidas. Isso permitiu a geração de indicadores até então inéditos, como o dimensionamento acurado dos dispêndios em P&D por tipo de instituição e setor de execução e de suas fontes de financiamento, constituindo uma matriz que combina essas duas óticas.
Os indicadores apresentados neste tema foram calculados a partir de diferentes fontes de dados, com destaque para duas fontes básicas: (i) Levantamento Primário de Informações sobre o Sistema Paulista de CT&I, realizado pela Fapesp, para as instituições não empresariais; e (ii) Pintec – Pesquisa de Inovação, produzida pelo IBGE e dirigida às entidades empresariais. A Pintec teve início em 2000 e sua última edição publicada referiu-se a 2017. Trata-se de amplo levantamento de informações sobre as atividades de inovação das empresas sediadas no Brasil, que estivessem em situação ativa no Cadastro Central de Empresas (Cempre), do IBGE; tivessem dez ou mais pessoas ocupadas em 31 de dezembro do ano de referência; e sua atividade principal fosse classificada, na CNAE 2.0, nas seções Indústrias Extrativas, Indústrias de Transformação e Eletricidade e Gás e em segmentos selecionados do setor de Serviços. Nas edições de 2005 e 2008, foram incluídas, no segmento de serviços de P&D, além de empresas, instituições da "administração pública" e entidades "sem fins lucrativos". A partir da Pintec de 2011, visando seguir mais de perto as recomendações da terceira edição do Manual de Oslo (OCDE, 2005), passaram a ser consideradas apenas as empresas que atendessem aos requisitos acima descritos. Em âmbito nacional, a Pintec gera indicadores para esse conjunto de empresas, mas, por restrições amostrais, seus indicadores regionais consideram apenas as empresas classificadas nas duas seções da indústria anteriormente mencionadas (IBGE, 2020).
A partir de 2021, o IBGE, em parceria com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial - ABDI e a Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, introduziu a Pintec Semestral. Sua cobertura abrange apenas as empresas industriais com 100 ou mais pessoas ocupadas e seu objetivo é complementar a tradicional Pesquisa de Inovação, da qual se origina, quer pela introdução de novos indicadores quer pela atualização, mais frequente, de indicadores existentes (IBGE 2024). Os dados disponibilizados pela Pintec 2017 e pela Pintec Semestral de 2022, sobre dispêndios e recursos humanos em P&D, foram utilizados na construção dos indicadores apresentados no tema Recursos Humanos e Financeiros em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), para o estado de São Paulo, após adoção de ajustes metodológicos.
Para as organizações não-empresariais, a fonte de informações é o levantamento primário da Fapesp, envolvendo um amplo conjunto de instituições com atividades relevantes de P&D e outras atividades científicas e tecnológicas no estado de São Paulo. A seleção dessas instituições baseou-se em estudos, aplicação de critérios específicos e entrevistas com especialistas. A primeira edição do levantamento primário da Fapesp foi realizada em 2019, tendo como referência o ano de 2018. Posteriormente, foram duas as edições: em 2021, com ano de referência de 2020, e em 2023, com 2022 como referência. Com isso, a Fapesp conta atualmente com uma nova série de indicadores de dispêndio e recursos humanos em P&D. O universo do levantamento primário abrange institutos de pesquisa, instituições de ensino superior e instituições de atendimento à saúde com atuação no estado de São Paulo, tanto as de natureza pública, estaduais e federais, quanto as de natureza privada. Entre os principais ganhos obtidos com esse levantamento estão a atualização do mapeamento institucional de CT&I em âmbito estadual e, sobretudo, o aprimoramento dos indicadores de dispêndio e de pessoal ocupado em pesquisa e desenvolvimento.
Conceitos e definições
A metodologia proposta pela OCDE está detalhada no Manual Frascati (OCDE, 2015) que, de forma simplificada, define como Dispêndios Brutos Nacionais em P&D (Gross Domestic Expenditures on Research and Development - GERD) aqueles realizados pelo conjunto dos executores dessas atividades, considerando todas as fontes dos recursos nelas aplicados. Essa proposta metodológica faz uma distinção clara entre as instituições que realizam atividades de P&D e aquelas que as financiam. Ressalte-se que nas estatísticas da OCDE, tanto as instituições executoras quanto as financiadoras são classificadas segundo sua natureza jurídico-funcional. A adoção dessa metodologia permite estimar os dispêndios realizados pelas instituições executoras de P&D, identificando as fontes de seu financiamento, com vistas a construir uma matriz que associe execução ao financiamento das atividades de P&D. A classificação adotada pela OCDE, cujas recomendações constituem a principal referência metodológica no campo dos indicadores de CT&I, também detalhadas no Manual Frascati (OCDE, 2015), segue de perto a classificação por natureza jurídica utilizada pelo Sistema de Contas Nacionais (SCN), mas com algumas distinções importantes. A principal delas refere-se ao estabelecimento de um setor específico, que tem a ver com sua finalidade e não com sua natureza jurídica, relativo às Instituições de Ensino Superior (IES). Tendo em vista a importância dessas instituições na execução das atividades de P&D e de suas especificidades organizacionais e funcionais, justifica-se separá-las de suas classificações originais (por natureza jurídica) e reclassificá-las de modo mais adequado à finalidade dessa classificação. Os setores do SCN compreendem: Entidades Empresariais; Administração Pública; Entidades sem Fins Lucrativos; Pessoas Físicas e Organizações Internacionais. Já os propostos pelo Manual Frascati são: Ensino Superior; Empresa; Governo; Privado sem Fins Lucrativos; e Exterior, neste caso apenas como setor de financiamento. A outra distinção entre as classificações adotadas pelo Manual Frascati e pelo SCN reside na desconsideração do setor Pessoas Físicas, cujos componentes são reclassificados nos setores Entidades Empresariais ou Entidades sem Fins Lucrativos, a depender das características de cada unidade. Como esse segmento é de menor relevância para as estatísticas de P&D, tal opção facilita a produção dessas estatísticas e não implica perdas relevantes em seu cálculo.
Procedimentos
Empresas
Para os anos de 2018 e 2020, em que não há execução da Pintec, os valores foram estimados pela variação média de Valor Adicionado setorial, considerando as informações da Pintec 2017. Os dispêndios empresariais compreendem apenas os realizados intramuros e inclui os realizados por empresas de prestação de Serviços de P&D, à exceção das empresas públicas, já computadas entre os Institutos de Pesquisa. Para a estimativa do valor dos dispêndios empresarias em 2022, solicitou-se ao IBGE tabulações especiais da Pintec 2017 e da Pintec Semestral de 2023, tanto para o Brasil quanto para as empresas localizadas em São Paulo, com informações sobre os dispêndios internos em P&D e a receita líquida de vendas. Tais tabulações permitiram construir um painel das empresas que realizaram dispêndios internos de P&D em ambas as pesquisas, quantificando, nos dois anos, as presentes no estrato certo de 2017. A partir desse painel, calcularam-se os dispêndios em P&D nesses anos e sua taxa de variação real, a qual foi aplicada nos valores dos dispêndios em P&D interna da Pintec 2017 para se estimar os valores de 2022. Esses valores foram confrontados com a evolução da receita líquida de vendas com vistas a checar a validade desse método.
Instituições de Ensino Superior
A partir das instituições cadastradas no Ministério da Educação (e-MEC), procurou-se identificar as localizadas em São Paulo, que realizam atividades de P&D. Para tanto, definiram-se os seguintes critérios de seleção: IES públicas estaduais e federais com unidade em São Paulo; e as IES privadas que oferecem curso de pós-graduação acadêmico, reconhecido e avaliado pela Capes, com nota superior a três. Para estimar os dispêndios das IES, levou-se em consideração o tempo de dedicação do corpo docente às atividades de pesquisa, a partir de levantamento primário realizado entre os professores da Unicamp². Os percentuais obtidos com tal levantamento foram aplicados às demais instituições de ensino, mas com certas particularidades a depender de sua natureza administrativa. No caso das IES públicas aplicaram-se esses percentuais (ajustados segundo a área de atuação dos respectivos docentes) a seus “fundos gerais”, isto é, ao total de recursos originários do Tesouro (estadual ou federal, a depender do caso). Consideram-se que receitas de outras fontes, como originárias de empresas, agências de fomento, instituições do exterior, tanto transferidas diretamente às IES quanto recebidas por meio de fundações de apoio, sejam integralmente computadas como dispêndios em P&D. Para as IES privadas foram considerados os valores de dispêndio por elas informados, ajustados por critério de comparação com o peso da pós-graduação na Unicamp.
Institutos de Pesquisa
Este segmento abrange os institutos de pesquisa públicos, estaduais e federais com unidade em São Paulo, e os institutos privados, identificados no cadastro da RAIS. Para estes últimos, partiu-se do conjunto de instituições ativas naquele cadastro, localizadas em São Paulo, classificadas na CNAE 72 (Pesquisa e Desenvolvimento). Uma vez identificadas, realizou-se levantamento secundário, por meio de seus sites na Internet e de contatos institucionais, buscando selecionar aquelas que realizam atividades de pesquisa e desenvolvimento em dimensão relevante. Para ambos os subconjuntos – públicos e privados –, investigou-se o percentual que cada instituição dedica às atividades de P&D. Para aquelas que tinham P&D como atividade principal considerou-se que o total de seus dispêndios equivaliam aos gastos com P&D. Para os demais, foi computada apenas a parcela correspondente ao percentual informado. Foram excluídos desse cálculo os dispêndios com atividades de produção (de vacinas e radiofármacos, por exemplo) e adicionados os demais recursos recebidos, de empresas, agências de fomento e instituições do exterior, tanto diretamente pelos institutos quanto por meio de suas fundações de apoio, no caso dos públicos.
Instituições de Atendimento à Saúde
A delimitação do universo das instituições de atendimento à saúde (IAS) públicas e privadas foi definida com base em entrevistas com pesquisadores da área médica e gestores da Secretaria de Saúde. Para o cálculo do dispêndio em P&D desse segmento, foi aplicado ao total de gastos da IAS a proporção do tempo de dedicação do seu corpo médico na realização de atividades de pesquisa clínica e de pesquisa básica e aplicada, e de desenvolvimento de novas técnicas, produtos e procedimentos médicos. No cálculo dos dispêndios em P&D desse subconjunto de instituições, foram agregados os valores de fomento recebidos pelas IAS e suas fundações de apoio. A soma dos dispêndios em P&D executados por essas três categorias de instituições – de Ensino Superior, de Pesquisa e de Atendimento à Saúde –, com os realizados pelas empresas, corresponde ao total dos dispêndios em P&D realizados em São Paulo.
Procedimentos
A mensuração do número de pessoas ocupadas em P&D baseou-se no Levantamento de Informações sobre o Sistema Paulista de CT&I da Fapesp e na Pesquisa de Inovação do IBGE, assim como em registros administrativos de concessão de bolsas de doutorado e pós-doutorado de Capes, CNPq e Fapesp. No levantamento primário sobre CT&I da Fapesp foram estabelecidos critérios específicos, por tipo de instituição executora de atividades de P&D (institutos de pesquisa, instituições de ensino superior e instituições de atendimento à saúde), para quantificar o número de pessoas ocupadas nessas atividades.
Institutos de Pesquisa
A mensuração do pessoal ocupado em P&D nos institutos de pesquisa seguiu dois procedimentos distintos. Nas instituições públicas foi considerado o enquadramento funcional de seus profissionais; nos institutos privados, a atuação em atividades de pesquisa e desenvolvimento. Dessa forma, as pessoas ocupadas em P&D nos institutos de pesquisa são contabilizadas em duas categorias: a) Pesquisadores: essa categoria compreende os profissionais contratados pela instituição e pelas fundações de apoio, nas carreiras específicas dos institutos de pesquisa públicos federais e estaduais; e pessoas contratadas pelos institutos de pesquisa privados para o exercício de atividades de pesquisa e desenvolvimento. b) Demais ocupados em P&D: essa categoria contempla outros profissionais engajados nas atividades de pesquisa e desenvolvimento, como técnicos e agentes de apoio que auxiliam nas tarefas relacionadas a atividades de P&D, como por exemplo, realização de pesquisas bibliográficas e seleção de material relevante de arquivos e bibliotecas; preparação de programas de computador; realização de experimentos, testes e análises; assistência técnica e suporte em P&D ou teste de protótipos; entre outras.
Instituições de Ensino Superior (IES)
A estimativa do número de pesquisadores nas IES se baseia na contagem de docentes engajados em atividades de ensino em nível de pós-graduação stricto sensu, na modalidade acadêmica, e de orientação de alunos de mestrado e doutorado, nas instituições públicas e privadas de ensino. Outro critério adotado refere-se à quantificação do número de pessoas contratadas para o quadro das IES na função de pesquisadores.
Instituições de Atendimento à Saúde (IAS)
Para mensurar o número de pessoas engajadas em atividades de P&D nas instituições de saúde, considerou-se o engajamento do corpo médico (médicos e outros profissionais de saúde de nível superior) na execução das atividades de pesquisa clínica, de pesquisa básica e aplicada, e de desenvolvimento de novas técnicas, novos produtos e procedimento médicos. Foi também investigado o número de técnicos de nível médio que apoia as atividades de P&D nos estabelecimentos de saúde que integram o universo do levantamento primário da Fapesp.
Empresas
Para quantificar os pesquisadores nas empresas em 2018 e 2020, utilizou-se o produto dos dispêndios em P&D interna estimados nesses dois anos pela razão entre o número de pesquisadores e os dispêndios em atividades internas de P&D, em 2017 (última Pintec disponível). Para 2022, adotou-se o produto dessa mesma razão pelo valor dos dispêndios em P&D interna estimados a partir da Pintec Semestral desse ano. Para esses cálculos, os valores monetários foram deflacionados pelo IPCA.
Contagem nominal de pesquisadores e demais ocupados em P&D
Na contagem nominal de ocupados em P&D, a Fapesp considera a quantidade de pessoas que atuam em atividades de P&D nas instituições que compõe o universo do levantamento primário, classificadas por tipo de organização executora de P&D no estado de São Paulo (institutos de pesquisa, instituições de ensino superior e instituições de atendimento à saúde), desagregada em pesquisadores e demais ocupados em P&D. O número de pesquisadores é medido pela simples contagem de pessoas que atua em atividades de P&D, somado ao número de bolsistas de doutorado e de pós-doutorado vinculado a essas instituições. A quantidade de demais ocupados corresponde a contagem de outros profissionais de nível superior e de nível médio que executam atividades de P&D nessas instituições. A contagem nominal é também apresentada nos quatro setores de execução recomendados pela OCDE (governo, ensino superior, entidade sem finalidade lucrativa, empresarial) a partir da classificação das instituições executoras nesses setores.
Estimativa dos pesquisadores e demais ocupados em P&D com equivalência de jornada integral
Para estimar o número de pesquisadores e de demais ocupados em P&D com equivalência a jornada integral, a contagem desses profissionais foi ajustada pelo tempo dedicado às atividades de P&D. Em relação aos bolsistas, considerou-se que os de pós-doutorado dedicam-se integralmente às atividades de P&D e os de doutorado, a metade de seu tempo a tais atividades.